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Cineasta da quebrada de SP, Daniel Fagundes leva periferias para as telas

Nascido e criado na zona sul de São Paulo, Daniel é responsável pela direção de fotografia de um documentário recém-lançado que discute o racismo estrutural

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Festival de cinema Super Off | Divulgação

Por: Gisele Alexandre

Notícia

Publicado em 29.09.2020 | 15:28 | Alterado em 29.10.2020 | 11:46

Tempo de leitura: 3 min(s)

Quem mora na zona sul de São Paulo, assim como eu, se sente em casa ao assistir às primeiras cenas do documentário “Dentro da Minha Pele”, filme dirigido por Toni Venturi e Val Gomes. As imagens aéreas que abrem o longa metragem são, talvez, a melhor representação visual já produzida para o verso “o mundo é diferente da ponte pra cá”, dos Racionais MC’s.

O olhar por trás das câmeras que retrataram as imagens são de alguém que sabe como é viver cruzando pontes entre a periferia e o centro da cidade. 

“Fico me perguntando o que é fazer cinema fora da periferia, porque esse sempre foi o meu contexto, o meu tema, o meu lugar de produção e de entendimento do que é a linguagem audiovisual”, conta o cineasta, educomunicador e poeta Daniel Fagundes, 34. 

Nascido e criado em Piraporinha, periferia da zona sul de São Paulo, atualmente ele mora no bairro do Bixiga, região central.

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Criado na periferia de SP, Daniel usa o cinema para incluir as periferias no debate público @Festival de cinema Super Off | Divulgação

Em “Dentro de Minha Pele”, documentário lançado em agosto deste ano, Daniel assina a direção de fotografia. Além desta função, também teve papel essencial na construção estética e narrativa do filme, que apresenta as várias camadas do racismo estrutural impregnado nas relações familiares e profissionais. 

Entre os exemplos está o relato do médico Estefânio Neto, cuja vida acadêmica e profissional teve casos de racismo, e a fala da trabalhadora doméstica Neide de Sousa, que viveu situações extremas de violência análogas ao período da escravidão.

Daniel foi convidado pelo diretor do filme, Toni Venturi, cineasta brasileiro, neto de italianos, conhecido por produzir obras sobre temas sociais.

“Confesso que, como um diretor branco tentando tratar desse tema [racismo], inicialmente eu fiquei com a pulga atrás da orelha”, conta Daniel. “Mas acho que o filme todo foi um processo muito importante pra ele [Toni], porque ele foi muito sensível em escutar as pessoas e ouvir sobre as coisas das quais ele, sendo um homem branco, tinha dificuldade de tratar”, conta Daniel.

Ele explica que todos da equipe, 95% deles negros, de alguma maneira ajudaram a construir provocações para o diretor trabalhar o tema de forma aprofundada e com respeito. 

Além do olhar cuidadoso na produção das imagens, Daniel também indicou referências importantes para a construção da mensagem abordada no documentário, a partir do olhar de um homem negro e periférico.

“Acredito nesse lugar de não me eximir da tarefa educativa, de estar com pessoas brancas, negras e indígenas efetivando o exercício da diversidade, porque eu acho que essa é a nossa importância dentro de uma sociedade justa”, completa Daniel.

CINEASTA DA QUEBRADA

Daniel tem uma importante atuação na periferia, onde aprendeu a desenvolver sua arte. Realizou cinco documentários longa-metragens, além de  documentários de ficção (doc fic), como “Videolência”, de 2009, sobre as várias formas de representação do conceito de “periferia” e “Sangoma”, de 2013, feito em parceria com as Capulanas Cia de Arte Negra, sobre a saúde da mulher negra.

A atuação na cultura periférica começou bem antes. Como gosta de dizer, Fagundes é cria do movimento dos saraus, que ganhou força no início dos anos 2000, especialmente com a Cooperifa e o Sarau do Binho. 

Além disso, ele conta ter sempre acompanhado os movimentos urbanos, principalmente aqueles ligados à cultura popular, à cultura caipira e à cultura negra. “Meu cinema veio das beiradas de campo. Meu primeiro curta foi feito no contexto de uma oficina e fala sobre o futebol de várzea”, conta o cineasta.

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O racismo institucional é tema de sua mais recente produção @Jerê Nunes | Divulgação

Daniel lembra que o início do seu trabalho esteve ligado à sua atuação no NCA (Núcleo de Comunicação Alternativa), um coletivo da zona sul que existiu por 15 anos e reunia profissionais de diferentes áreas da comunicação social. Apesar do NCA ter encerrado oficialmente em 2017, Daniel herdou uma de suas ações: a Videoteca Popular.

“A Videoteca Popular é um acervo de memórias de produção de coletivos e de realizadores do cinema independente e do cinema nacional”, explica Daniel.

Atualmente, Daniel, junto com a companheira Fernanda Vargas, tocam a Caramuja de Pesquisa, Memória e Audiovisual, uma produtora com foco no resgate e registro da memória, por meio da produção de documentários, livros e pesquisas em torno das tradições populares, sejam elas do campo ou da cidade. 

Outros dois documentários estão sendo finalizados pelo cineasta e devem ser lançados nos próximos meses. O primeiro chama-se “Olhar de Edite”, sobre a história da poetisa conhecida como a rainha da Cooperifa, Edite Marques da Silva, 77. 

O segundo se chama “Oxente Bixiga” e retrata a comunidade nordestina do bairro [em geral conhecido pela comunidade italiana].O longa metragem “Dentro de Minha Pele” está disponível para assinantes do Globo Play. Outros trabalhos do cineasta Daniel Fagundes podem ser encontrados no site www.caramuja.com.

*Texto corrigido: o filme está disponível no Globo Play e não no ‘Google Play’ como publicado inicialmente.

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Gisele Alexandre

Jornalista de quebrada, educomunicadora, coordenadora de projetos, fundadora do podcast Manda Notícias e integrante da Escola Feminista Abya Yala. Mãe do Pedro Henrique, libriana, apaixonada por gatos e pelo trabalho. Correspondente do Capão Redondo desde 2018.

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