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Em Mogi das Cruzes, Escola do Grau ensina a empinar moto de forma segura e fora das ruas

Por: Renan Omura

Em um pátio de 40 metros quadrados, no bairro Vila Industrial, em Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo, motociclistas de diversas idades aprendem a dar grau – andar somente com a roda traseira da moto. Embora a prática seja proibida segundo as leis de trânsito, a manobra é febre nas periferias brasileiras há muito tempo.

“Eu costumo dizer que antes o Brasil era o país do futebol, hoje é o país do grau”, afirma o empreendedor Rodrigo Buzulini, 36.

Ele é proprietário da R.B Escola do Grau, uma espécie de “autoescola” onde os alunos aprendem a empinar moto sob orientação de instrutores. Criada há dois anos, a empresa conta com quatro unidades no estado de São Paulo, localizadas em Mogi das Cruzes, Osasco, Guarulhos e Sorocaba.

Rodrigo Buzulini é dono da R.B Escola do Grau, uma espécie de “autoescola” onde os alunos aprendem a empinar moto @Renan Omura / Agência Mural

Rodrigo desenvolveu uma metodologia de ensino onde os motociclistas usam um equipamento de segurança conhecido como “máquina do grau”. O dispositivo é instalado na traseira da moto e impede que o piloto caia para trás enquanto pratica a manobra. Até o momento, não há registros de acidentes.

Apesar de a escola do grau não estar credenciada como CFC (Centro de Formação de Condutores) e nem cadastrada no Detran, Rodrigo garante que a empresa segue todos os protocolos exigidos pela prefeitura, inclusive conta com o laudo do bombeiro.

“Sim, dar grau é crime, mas quando é feito em via pública. Em um local fechado com os equipamentos de segurança não tem problema”

Rodrigo Buzulini, proprietário da R.B Escola do Grau

O grau faz parte das manobras de wheeling, esporte que envolve malabarismo com motocicletas e bicicletas criado na década de 1970 nos Estados Unidos. A modalidade se popularizou no Brasil em 1990 e, hoje, conta com diversos adeptos que particiapam de campenatos estaduais, nacionais e internacionais.

No entanto, mesmo que a prática de empinar motos seja uma manobra esportiva, a atividade é discriminada no Brasil.

Equipamento de segurança conhecido como “máquina do grau” @Renan Omura / Agência Mural

“Você já viu algum praticante de wheeling fazer manobras nas ruas? É claro que não. Por isso que o grau é malvisto, pois acaba colocando a vida do piloto e das pessoas em perigo”, justifica Rodrigo.

Sujeito à multa e cacete

O CTB (Código de Trânsito Brasileiro) é bastante claro em relação à prática de manobras perigosas em via pública. O artigo 244, inciso III, estabelece que conduzir motocicletas “fazendo malabarismo ou equilibrando-se apenas em uma roda” configura-se em infração gravíssima, com penalidade de multa e recolhimento de habilitação.

No entanto, não é somente a lei de trânsito que proíbe esse tipo de manobra. Desde dezembro de 2021 faixas com os dizeres “Proibido tirar de giro e chamar no grau. Sujeito a cacete. Não vamos aceitar essas coisas na comunidade” foram espalhadas supostamente por uma facção criminosa em algumas periferias do estado de São Paulo.

Mesmo assim, é comum no dia a dia encontrar jovens empinando a moto nas ruas. O próprio dono da escola assume que aprendeu a dar grau de forma inconsequente quando era jovem. “Estamos tentando mudar isso. Meu objetivo é tirar o grau da rua e levar para um local fechado e seguro”, afirma.

A cidade de Belo Horizonte, Minas Gerais, e o município de Araucária, no Paraná, aprovaram uma lei que permite a prática do grau em locais fechados e definidos pela gestão municipal. A intenção dos projetos é difundir a modalidade esportiva de forma consciente e reduzir os sinistros no modal de moto.

De acordo com o Infosiga, no estado de São Paulo foram registradas 2.089 mortes de condutores, passageiros e pedestres envolvendo motociclistas em 2022. Um aumento de 8% em comparação a 2021. Portanto, iniciativas como a escola do grau são fundamentais para reverter esse quadro.

O motoboy e aluno da escola do grau Richard Richelly, 25, se envolveu em dois acidentes recentemente enquanto trabalhava. Ele conta que sofreu os sinistros durante as entregas e não estava empinando a moto. O jovem aconselha os motociclistas a serem mais conscientes.

Richard Richelly é aluno da R.B Escola do Grau @Renan Omura / Agência Mural

“Passei por dois acidentes recentes e isso me fez pensar muito. A galera que dá grau nas ruas, tem que ter mais cuidado. Para aqueles que criticam a gente por fazer aula, continua aí correndo risco de se machucar, tomar multa ou ter a moto apreendida”, diz Richard.

Nutella, não!

Dener Prado, 25, vulgo Dichava, é um dos instrutores da R.B Escola do Grau. Ele começou a empinar moto quando tinha 19 anos e, assim como a maior parte dos motociclistas, aprendeu a manobra nas ruas, mas conta que se pudesse teria feito aulas.

“É normal alguns moleques que não sabem dar grau chamarem a gente de Nutella por praticarmos em um local fechado. Mas quando eles vêm aqui acabam se surpreendendo, pois provamos que é possível aprender a empinar sem cair”, relata.

O instrutor explica que em média um aluno chega a fazer de três a quatro aulas para aprender a dar grau, mas isso pode mudar conforme a habilidade do motociclista. Para fazer o curso basta ser habilitado e ter uma experiência mínima em pilotagem.

“É normal alguns moleques que não sabem dar grau chamarem a gente de Nutella. Mas quando eles vêm aqui acabam se surpreendendo”, relata Dener Prado, instrutor da escola do grau @Renan Omura / Agência Mural

O valor do curso referente às unidades de Mogi das Cruzes, Osasco e Guarulhos é R$ 125 por uma hora de aula, R$ 220 por duas horas e R$ 300 por três horas.

A empresa ministra aulas para mulheres e motociclistas de todas as idades. “Nós ensinamos todos, sem exceção. Só encostar”, afirma Dener.

O motoboy Armando Filho, 29, está começando as aulas na R.B Escola do Grau. Ele trabalha há 6 anos nas ruas da capital paulista fazendo entregas de moto, mas ainda não dominou a manobra.

“Vamos quebrar esse tabu! Nem todo motoboy sabe dar grau, e eu sou um deles. Por isso, estou aqui aprendendo de forma segura, sem colocar as pessoas em risco e sem prejudicar a minha moto, que é meu ganha pão”, conclui Armando.

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