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‘Transformar praça em parque não pode ser algo automático’, diz urbanista

Por: Redação

Com 22 mil m² de aréa verde, o Parque Buenos Aires, localizado em Higienópolis, no centro da capital paulista, até 1992 era uma praça. Desde o ano passado, quem parece seguir o mesmo processo de transição é a praça Pôr do Sol, em Pinheiros, na zona oeste, sob polêmicas, especialmente em relação à possibilidade de colocar grades, o que pedem alguns moradores do bairro.

Para entender as semelhanças e características do que é uma praça e um parque, o 32xSP conversou com o professor de arquitetura e urbanismo das universidades Belas Artes e FMU, Anderson Kazuo Nakano.

Segundo Nakano, é preciso planejamento. ‘Transformar praça em parque não pode ser uma coisa descuidada e automática. Precisa ter critérios ambientais’. Para ele, antes disso, é necessário compreender os contextos e distinções histórico-urbanístico, institucional, orçamentário e ambiental.

“A origem de praça na cidade antecede à existência do parque. Ela foi criada desde a antiguidade clássica, perto das igrejas, geralmente em meio a troca de mercadorias, como um lugar de intercâmbio”, afirma o ex-diretor do Departamento de Urbanismo da Secretaria Municipal do Desenvolvimento Urbano de São Paulo.

“Já o parque tem uma história mais recente. Consolidou-se na cidade no século 19 e 20 em meio ao crescimento e transformações dos centros urbanos, com a industrialização”, completa.

De acordo com o especialista, com a acentuação dos problemas urbanos, fruto da industrialização, amplificaram problemas como insalubridade e poluição. Nesse contexto, foram criados os parques, com áreas verdes, como já existiam na Inglaterra e na França. “A busca por um lugar dentro da cidade no qual as pessoas tivessem contato com a natureza. Uma ideia romântica”, diz Kazuo.

Junto ao contexto histórico também está o aspecto urbanístico. As praças não precisam ser necessariamente arborizadas, como acontece em muitas cidades europeias, por exemplo. Sua configuração tradicional está nas bordas, no caso, nos comércios. A Praça do Patriarca, o Largo do Café, o Pátio do Colégio compõem esse cenário. Diferentemente da Praça 14 Bis, que não se caracteriza do ponto de vista urbanístico.

Outra distinção é a institucional. Os parques são de responsabilidade da Secretaria do Verde e Meio Ambiente, enquanto a praça é de tutela da Coordenação de Subprefeituras. A primeira fica incumbida da manutenção dos parques, enquanto a segunda assume a responsabilidade de revitalizar. Em cada uma delas, também estão condicionadas diferenças orçamentárias, o que implica em diferentes modelos de gestão.

“A Secretaria [do Verde e Meio Ambiente] adota a divisão do modelo a partir do conselho diretor, de representadores do bairro. As praças não contam com conselhos.

Essa distinção institucional, no Plano Municipal, tem todas as implicações, responsabilidades, modelos de gestão e orçamentário”, explica Kazuo, que trabalhou no Ministério das Cidades e na elaboração do Plano Nacional de Habitação.

Segundo ele, atualmente os parques municipais passaram a ser reconhecidos como parte do Sistema Nacional de Unidades de Conservação. “Os parques não devem ser vistos apenas uma área de lazer, mas como uma função ambiental como realizar drenagens — não só do parque, mas da vizinhança–, se houver nascentes, conter áreas de proteção, entre outros”, elenca. A praça, no entanto, não necessariamente precisa ter essa responsabilidade ambiental.

Parque Buenos Aires, no bairro de Higienópolis Foto: São Paulo Urgente

“Transformar uma praça em parque não pode ser uma coisa descuidada e automática. Precisa ter critérios e responsabilidades para que a área exerça uma função ambiental para a cidade”, reforça.

“Deixar um pedaço de área livre, colocar playground não é torná-la uma praça. Praça é uma configuração urbana, definida junto com as edificações. O que temos hoje ao redor são ruas e avenidas. Precisamos ter atividades”, pontua o urbanista.

Vão livre do Masp

De acordo com Kazuo, a Pôr do Sol é valorizada porque uma característica semelhante ao vão livre do Masp (Museu de Arte de São Paulo), no centro da cidade: o horizonte. “São poucos lugares que têm horizonte em São Paulo, ao contrário do Rio de Janeiro. Você vai para a praia e descansa o olhar porque tem horizonte. No caso da Pôr do Sol, do ponto de vista de arborização não tem nada de especial. É uma área normal”, diz.

Em relação à polêmica envolvendo a possibilidade de gradil, Kazuo é contra. “Colocar grades é uma ilusão. Não são elas que garantem segurança. É mais um controle, de definir o horário de abertura e fechamento do local”, diz.

Em agosto de 2015, o prefeito Fernando Haddad (PT) firmou um decreto que transforma a praça Pôr do Sol em parque. A implantação está no papel.

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Kazuo, no entanto, afirma que é “desonesto afirmar que [a praça Pôr do Sol] é um parque”. “Para transformar em parque tem que ter projeto e chamar não só arquitetos e urbanistas, mas fortalecer questões ambientais. Se tivesse gestão participativa das praças, não precisaria transformar em parque”, finaliza.

Foto: Lu/ Flickr

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