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Capoeiristas reverenciam mestre Pastinha e celebram Dia Nacional da Capoeira Angola

Por: Lucas Barbosa

Mestres Dinei, Zé do Lenço, Faísca e Ciro, que anualmente comemoram Dia Nacional da Capoeira Angola @Lucas Barbosa/Agência Mural

Todos os anos, mestres e mestras da capoeira se reúnem em diversas rodas de Salvador e pelo mundo para comemorar, no dia 5 de abril, o Dia da Nacional da Capoeira Angola, em homenagem ao nascimento de Vicente Ferreira Pastinha, o mestre Pastinha, responsável pela difusão da modalidade da cultura no Brasil. 

Este ano, por conta da pandemia do corona vírus, as rodas precisaram ser canceladas na capital baiana. Contudo, capoeiristas de diversos grupos de Salvador ressaltam a importância da data e da memória do Mestre Pastinha, nascido na capital baiana, em 1889 e falecido aos 92 anos, na cidade.  

“Ele foi um grande filósofo, deixou muitos ensinamentos, difundiu e deu visibilidade para que a capoeira angola estivesse hoje aí no mundo. Onde tem roda de capoeira, se fala do mestre pastinha, onde tem capoeira angola, ele está presente”, conta Cristiane Santos Miranda, 37, a mestra Nani. 

Uma das responsáveis pelo CECA (Centro Esportivo Capoeira Angola), da matriz Salvador, mestra Nani é formada em educação física e neta do mestre João Pequeno que, além de seu mestre, foi considerado um dos principais discípulos de Pastinha e responsável por dar continuidade ao seu legado.

Mestra Nani, neta do mestre João Pequeno, discípulo de Pastinha @Acervo CECA Matriz Salvador

Para a mestra, o 5 de abril é uma oportunidade de propagar o conhecimento sobre a modalidade e sua história. “Vou para as escolas e encontro crianças, jovens, adultos que não conhecem a capoeira angola, mas nas periferia, a realidade está mudando, porque tem grandes educadores, mestres, mestras, professores, contramestres que estão difundindo seus conhecimentos. Então, o 5 de abril tem a responsabilidade de conscientização da importância de preservação e continuidade da capoeira angola e a luta de grandes mestres e mestras.” 

Ras Ciro Lima, 56, o mestre Ciro, fundador do CECA, da matriz Pernambués, há 33 anos, relembra a escolha da data e a participação do mestre João Pequeno. “O dia começou a ser lembrado com o Mestre João Pequeno elegendo uma data que tivesse relação com a capoeira angola. Devido a importância do mestre Pastinha, foi escolhido o dia do seu nascimento. Vários mestres participaram da primeira realização pública de uma roda pelo dia, em 1992”, conta. 

Por conta das medidas restritivas impostas pela pandemia, mestre Ciro fará uma live para falar da importância do Dia da Capoeira Angola, às 20h, em sua página do Facebook (https://www.facebook.com/rasciro.lima)

BAIANOS DEFENDEM O 5 DE ABRIL COMO DATA OFICIAL

Apesar das comemorações anuais, a data faz contraponto ao dia 3 de agosto, quando se comemora o Dia do Capoeirista, conforme a Lei nº 4.649 de 1985, do governo do estado de São Paulo.

“Todos os dias importam para nossa Angola, então o 5 de abril é um desafio ao sistema para comemorar diante das expectativas criadas, porque o ‘dia do capoeirista’ não é uma data que define nada sobre quem somos. Mas o 5 de abril nos representa, porque o mestre Pastinha era um nome de peso, de referência para todos nós e continua sendo”, diz o mestre Ciro.

Para Elinei Jorge Rodrigues Santa Rosa, 44, o mestre Dinei, responsável pelo Grupo Ginga Artes, do bairro Cidade Nova, o Dia do Capoeirista celebrado em agosto levanta diversos questionamentos. 

“O que me faz lembrar o 3 de agosto? Qual fato realmente importante aconteceu nessa data que você leva a referência para ser dia do capoeirista? Fui estudar e vi que tinha partido do município de São Paulo em 1985 e, de repente, todo mundo festeja como se fosse realmente uma data importante, mas que não tem fundamento. É uma invenção para preencher calendário”, avalia. 

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Outro que defende o 5 de abril como data oficial para a capoeira é José Alves, de 72 anos, internacionalmente conhecido como mestre Zé do Lenço. Artesão de instrumentos musicais, ele é fundador da Associação de Capoeira Angola Relíquia de Espinho Remoso, com sede na Sete Portas e no mercado São Miguel, além de outros núcleos da Bahia. 

O mestre conta que a data foi incorporada ao calendário da ABCA (Associação Brasileira de Capoeira Angola) durante sua gestão, como Dia Nacional da Capoeira Angola. 

“Foi anexada por mim, o mestre Bola Sete, o mestre Bom Cabrito, mestre Pelé, mestre Gildo Alfinete e outros mais. Colocamos essa data como dia nacional da capoeira angola. Na época, realizamos uma roda na Igreja São Rosário dos Pretos. Foi a maneira mais justa porque o mestre Pastinha foi o patrono da capoeira”, diz mestre Zé do Lenço.

QUEM FOI MESTRE PASTINHA?

Vicente Ferreira Pastinha nasceu na Rua do Tijolo, em Salvador, Bahia, em 5 de abril de 1889, filho de espanhol e uma mulher negra. Aos oito anos, conheceu a capoeira Angola por meio do mestre Benedito, um africano que o observava apanhar constantemente de um garoto na rua.  Nesta época, a capoeira era perseguida pela polícia. 

Aprendeu as técnicas e venceu seu rival. Na Escola de Aprendizes Marinheiro, aprendeu esgrima e estudou música. Em 1910, deixa a escola e passa a dedicar sua vida ao ensino da capoeira angola. 

O mestre Pastinha deixou um livro que contém a sua história e os processos que levaram à criação e organização do CECA. Os manuscritos de Pastinha, como são conhecidos, são um legado que conta a metafísica da capoeira e a filosofia do esporte através da sua trajetória.

Mestre Pastinha foi um defensor, organizador e propagador da capoeira angola, a modalidade tem em sua bateria oito instrumentos que dão um ritmo lento e swingado ao jogo; através dos seus cantos conta histórias, aprendizados e lamentos do cotidiano dos angoleiros e angoleiras. Diferente da capoeira regional criada pelo mestre Bimba, que na bateria possui um berimbau e dois pandeiros; a modalidade dá espaço para outros movimentos de lutas brasileiras em um ritmo acelerado e com saltos. 

A vestimenta também é uma característica que diferencia as duas modalidades, a capoeira angola é praticada com camisa de manga, calça e sapatos; enquanto a capoeira regional é jogada descalça, também de calça, mas sem exigências de camisa. 

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