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'Tô Legal': ambulantes reclamam do valor da taxa e da falta de ruas para trabalhar

Lançado há seis meses pela Prefeitura de São Paulo, projeto visa tirar trabalhadores da ilegalidade

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Por: Redação

Publicado em 03.02.2020 | 20:19 | Alterado em 03.02.2020 | 20:19

Tempo de leitura: 4 min(s)

Enquanto leva seu carrinho de gelinho para o meio da calçada em uma rua larga na região do Anhangabaú, no centro da capital paulista, Amanda* fica atenta aos grupos do WhatsApp no celular.

“Eu tô de olho porque a volante [fiscal da Prefeitura de São Paulo] estava passando por aqui. No grupo, os outros ambulantes avisam”, alerta. “Até ontem eu estava trabalhando com permissão, mas não consegui renovar com a prefeitura”.

A permissão, chamada de Portaria de Autorização, é emitida por meio do Programa “Tô Legal!”, lançado em julho de 2019. A iniciativa foi criada para fornecer autorizações temporárias para o comércio nas vias públicas da cidade. 

De acordo com a prefeitura, desde a criação do projeto, o sistema já contou com 15.801 solicitações de licença e 10.961 autorizações emitidas em um sistema totalmente digital.

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Uma das estratégias adotadas pelos ambulantes para barrar a fiscalização são os grupos de WhatsApp (Ana Beatriz Felicio/32xSP)

Para se cadastrar, o interessado deve entrar no site e enviar os documentos, sem necessidade de ida à subprefeitura. Depois disso, escolhe o local de interesse e consulta a disponibilidade, indicando o ponto e período desejado. 

O termo de permissão de uso do espaço dura por, no máximo, 90 dias e deve ser renovado depois deste período. Além da autorização para comércio temporário, o programa também faz a emissão de Termos de Permissão de Uso (TPU) para valet, mesas, cadeiras e bicicletas compartilhadas.

NÃO TÁ LEGAL

Apesar da desburocratização para conseguir a licença, alguns ambulantes apontam que as principais vias do centro da cidade não estão disponíveis para cadastro. 

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Ambulantes reclamam que principais ruas do centro não estão cadastradas no programa (Ana Beatriz Felicio/32xSP)

Amanda trabalha há três anos na mesma região. No começo do programa ela conseguiu a permissão para atuar por ali, mas quando foi tentar pegar o termo de permissão novamente percebeu que o entorno das ruas 7 de abril e 24 de maio, e da Praça Dom José Gaspar, não estavam mais habilitadas. 

“O problema do Tô Legal! é que a prefeitura só quer que a gente trabalhe onde eles escolherem. Não levam em consideração a nossa clientela já conquistada. Não é justo. Até ontem estava tudo certo, e depois essas ruas sumiram das opções”

Amanda*, vendedora ambulante que trabalha no centro

A prefeitura alega que 70% da cidade está disponível para cadastro, mas que regiões como Brás, 25 de Março, Liberdade e arredores do Mercado Municipal são bloqueados por já possuírem TPUs suficientes. 

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A pasta afirma ainda que os pontos disponíveis no sistema do Tô Legal! podem variar por fatores como: obras nas vias ou bloqueio para eventos. Mas não informou o motivo das ruas citadas por Amanda terem saído das opções.

VALOR DA TAXA

O valor da taxa do Tô Legal! varia de acordo com o preço do metro quadrado da região escolhida e do tamanho do equipamento, sendo no mínimo R$ 5,46 por um período por dia. A mesma pessoa não pode emitir duas autorizações em locais diferentes no mesmo dia e horário.

Para o vendedor ambulante Sidibe Lansise, 28, tanto o valor como a regra são ruins. 

No começo de janeiro, ele conseguiu a permissão para vender coco no parque da Aclimação, na região central da cidade, para os próximos 90 dias, tendo que pagar um  montante de R$ 982,80, taxa que considera alta. “Eu ganho cerca de R$ 1.500 por mês, vou ter que tirar deste valor para pagar a liberação”.

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O ambulante Sidibe Lansise intercala a venda de cocos no parque da Aclimação com a barraca de produtos naturais no centro (Ana Beatriz Felicio/32xSP)

Lansise ainda intercala a venda de coco com a de produtos naturais na República, também no centro, devido a um acordo que fez com os outros vendedores do parque. 

“No final de semana todo mundo fica lá, mas durante a semana intercalamos e eu venho para cá”, conta.

Nos dias que está com o carrinho, Lansise atua sem autorização. “Não consegui emitir duas autorizações. Já perdi muitas vezes coisas para a polícia. Eles levam tudo e eu tenho que pagar uma multa para conseguir retirar”.

O ambulante nasceu em Mali, na África Ocidental. Veio para o Brasil em 2016 e lamenta não ter capital suficiente para investir na abertura de uma loja física. 

“Trabalhava em uma loja com carteira assinada, mas as vendas ficaram ruins e fui mandado embora há dois anos. Desde então trabalho na rua. Meu sonho era abrir uma loja, mas não tenho condição financeira. Já fui ver e precisa ter muito dinheiro para conseguir abrir um negócio”
Sidibe Lansise, vendedor ambulante do centro de SP

João*, que trabalha com a esposa Rosa* há 18 anos vendendo doces e amendoins em um carrinho pelo centro, também opera na ilegalidade. O casal não conseguiu a autorização nenhuma vez.

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Ambulantes não querem mudar ponto de venda para não perder a clientela já conquistada (Ana Beatriz Felicio/32xSP)

“Quando vi sobre o programa na televisão achei muito legal, seria maravilhoso para gente”, conta Maria. “Mas depois vimos que ele não funciona do jeito que a gente quer, é do jeito que a prefeitura quer. Aqui no centro, não conseguimos em lugar nenhum”. 

“É uma enganação, porque além de não ter a opção das ruas, você precisa pagar uma taxa alta pelo espaço, mais o valor do carrinho e da mercadoria. Ter que ficar renovando a cada três meses é muito ruim, tinha que ser uma opção anual, atrapalha isso de ser rotativo para quem já tem uma clientela”
João*, vendedor ambulante

A prefeitura informa que nestes seis meses, o “To Legal!” já arrecadou cerca de dois milhões e oitocentos reais com liberação de licenças. Para ver os locais disponíveis e licenças já emitidas, clique aqui.

*Ambulantes não quiseram se identificar.

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