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Hora de acordar! Tem um mundo de coisas para fazer e aprender… com nossas mães!

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Por Redação | 08.05.2016

Publicado em 08.05.2016 | 15:05 | Alterado em 31.01.2023 | 15:57

Tempo de leitura: 3 min(s)
Maria Aparecida Silva e Lucas Veloso, mãe e filho em selfie — Foto: Arquivo pessoal

“Lucas, acorda! Lucas, acorda que já são oito horas. Você quer dormir até que horas?”, a pergunta irônica sobre o horário faz parte dos textões de bom dia da dona Cida ou Maria Aparecida Silva, de 53 anos, a minha mãe.

Uns minutos a mais na cama e as mensagens seguintes disparam com demandas. “Levanta que você tem que pelo menos lavar a louça da pia e limpar o fogão antes de sair para rua”.

As tarefas e os acordados em casa dependem de quem vai ficar e, claro, do humor dela. Eu e meus irmãos, Karolina, 20, e Elias, 19, aprendemos desde cedo que a casa é uma obrigação de todos. Sem “boi” e distinção de gênero para as tarefas. “Vocês não têm o direito de ficar explorando mulher nenhuma”, disse sempre, dividindo tudo.

O fato é que nenhum de nós três gostamos muito dos afazeres domésticos e, por causa disso, nos acostumamos a sermos convocados para reuniões diárias no sofá com ela. A pauta era sempre a importância de ajudar em casa. Mas como se tratavam de praticamente um monólogo dela, apelidamos aquela conversa de “palestra da mãe”.

Mensagens de Dona Cida

Trazida da cidade de Cocos, na Bahia, aos 18 anos para São Paulo, minha mãe veio na companhia de uma senhora que prometeu aos pais dela uma vida melhor na cidade grande. Aqui, ela foi empregada na casa da senhora para cuidar de uma idosa. Uma semana depois, foi dispensada do serviço doméstico e teve que começar se virar sozinha. Trabalhou como empregada doméstica e com muito esforço e dedicação, conseguiu concluir o ensino fundamental e médio, o último pago. Hoje, se autodenomina “passadeira de roupas”, cargo para sua atividade profissional atual.

Nada foi fácil e, por isso, a cobrança aos filhos é repassada. Às vezes, me divirto com algumas delas.

A hora do banho sempre foi um espaço muito artístico em nosso lar. Todos cantam embaixo do chuveiro e quando isso dura alguns longos minutos somos cortados pelos berros dela. “Tá pensando que tá no palco? Canta aqui fora que aí não é estúdio de música” ou “fica cantando aí até eu entrar neste banheiro e tirar você do banho com uma surra”. Para o nosso bem, nenhuma ameaça se concretizou.

Economia é a questão. Assim como no banho, há outros exemplos disso. Nunca fui muito fã de feijão, mas já até encarei por conta da justificativa usada por ela: “pobre tem que comer feijão porque é mais barato”.

Mas não adianta. Não desce. E olha que ela já tentou diversificar ao máximo dos tipos e receitas. Teve feijão-preto, feijão-verde, feijoada, feijão de soja…

Meu forte são as carnes. Porém como nem sempre há dinheiro para mistura, ouvi os melhores motivos para desviar minha atenção.

1º) Não era filho do açougueiro;
2º) Nenhum pobre vive sem comer comida de pobre;
3º) Nem rico como carne todo dia.

A solução encontrada por ela para me unir um pouco ao grão foi a de separar o caldo do feijão quando cozido. Então, toda vez que tem feijão, o caldo é separado e coado para que eu tome. Com isso, fico com menos cara de desnutrido, segundo a ciência dela.

Ah, dona Cida… Se você soubesse o quanto me sinto mais forte com seus caldinhos e exemplos. Você, minha mãe, representa muitas mães lindas, negras, nordestinas, de periferia e verdadeiras fortalezas.

Hoje, vale até um agradecimento pela lista de afazeres, o menos mistura e mais feijão ou os banhos curtos sem cantorias. Já aproveitando, obrigado também pelos sucos naturais depois de chegar da faculdade, por me buscar no trem, por me falar de Graciliano Ramos, pela casa construída, pelo papel de pai e mãe realizado de forma genial e pela humanidade com a qual a soube nos criar para sermos quem somos. De filho para mãe. De Guaianases para o mundo.

Lucas Veloso, correspondente de ​Guaianases

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