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Agência de Jornalismo das periferias

Léu Britto/ Agência Mural

Por: Jacqueline Maria da Silva

Notícia

Publicado em 01.09.2023 | 19:05 | Alterado em 02.09.2023 | 10:15

Tempo de leitura: 4 min(s)

O que a Biologia tem a ver com o ônibus que passa todo dia na quebrada? E com o preparo do almoço? E ainda com o rolê do final de semana? Tudo, segundo o professor Renan Farias Soares, 38, que desde 2012, leciona a disciplina para os alunos da Escola Técnica Estadual (Etec) Paulistano, na zona norte da capital paulista.

“Eu gosto de trabalhar assuntos que vão além do conteúdo, que motivem o desenvolvimento pessoal do aluno, o senso crítico e que ajudem não só no vestibular, mas na vida”, disse o biólogo. A profissão é tão relevante, dentro e fora da sala de aula, que tem um dia especial para marcar sua contribuição para o desenvolvimento da ciência: 3 de setembro.

Com tanto compromisso com os alunos, a escola vira o lugar ideal para falar sobre o funcionamento do corpo humano e alertar para os riscos das doenças sexualmente transmissíveis; ou para discutir racismo e preconceito a partir de genética e bioética; ou ainda para estudar ecologia e ao mesmo tempo chamar atenção para o problema do desmatamento da Amazônia.

“A internet é uma ferramenta para fazer com que mais jovens gostem de Biologia”

As possibilidades são infinitas, como diz Renan, que em um de seus projetos trabalha com os alunos conceitos de fisiologia por meio dos efeitos das drogas lícitas e ilícitas no sistema nervoso central.

“Eu peço para apresentarem o tema, mas não só fazerem a pesquisa. Eles devem trazer casos de pessoas que conhecem e que passaram por situações de uso dessas substâncias, para falarmos das consequências na prática”, diz o professor, que tenta aproximar temas científicos da realidade dos alunos.

As aulas em campo organizadas por Renan também contribuem com os debates: uma caminhada pelo bairro, por exemplo, ajuda os alunos a entenderem os efeitos da urbanização nos cursos de água ou as condições de saneamento básico de uma determinada comunidade. Já a visita ao shopping da região, que tem um telhado verde e sistema de compostagem, permite avaliar a flora, os microorganismos da degradação do lixo e os processos de reciclagem.

Um dos sonhos do professor é levar os alunos para trabalhos de campo fora de São Paulo, incluindo visitas a cavernas, serras e praias, para estudar sobre a composição de rochas ou sobre a vida nos oceanos, por exemplo.

“Infelizmente a gente não tem recurso para isso dentro da escola pública, diferente das particulares em que você tem esses tipos de passeio, porque tem condições de bancá-los”, desabafa.

O Fantástico Mundo da Biologia

Foi justamente para ampliar oportunidades aos alunos das escolas públicas que ele criou, em 2020, O Fantástico Mundo da Biologia, um canal nas redes sociais que mescla entretenimento com conhecimento científico. Na época, em isolamento social devido a pandemia de covid-19, o canal foi uma forma de manter os alunos interessados nos estudos.

“Vários deles não tinham condições de acompanhar as aulas, porque não possuíam celular ou tinham que dividir com o pai e ou responsável. Com o canal, eles podiam estudar durante a noite ou até no final de semana”.

A aposta foi certeira, tanto que hoje já são pelo menos 23 mil seguidores no Instagram, 4,56 mil inscritos no Youtube e 2 mil no Tik Tok. Com vídeos que ultrapassam 400 mil visualizações, Renan tira dúvidas de alunos e seguidores, prepara a galera para o vestibular, desvenda curiosidade, esclarece fake news e até traduz assuntos científicos bastante complexos.

“Uma vez eu fiz uma enquete para saber qual bicho as pessoas extinguiriam da Terra, depois peguei a resposta e fiz vídeos mostrando porque eles não deveriam ser extintos, mostrando a importância de cada animal para a natureza”.

Renan é responsável por todo o processo de produção dos materiais, do roteiro à postagem, o que exige tempo do professor. Por isso, apesar de adorar a função, nem sempre consegue alimentar os canais com a frequência que gostaria, já que concilia seu tempo com cargos de professor da Etec, da Univesp e com seu doutorado.

“Na sala de aula eu consigo atingir uma quantidade limitada de pessoas. A internet é uma ferramenta para fazer com que mais jovens gostem de Biologia e tenham consciência ecológica“, diz.

Recentemente, ele criou uma loja virtual de camisetas com ilustrações divertidas sobre a vida dos bichos, elaboradas por meio de Inteligência artificial. “Os alunos viam as minhas camisetas e queriam uma, aí resolvi fazer para complementar a renda”.

Paixão pela ciência inspira jovens e ajuda a desenvolver consciência ambiental @Léu Britto/ Agência Mural

Como nasce um biólogo?

Apesar de ser um professor dedicado, por muitos anos Renan sonhou em ser médico, mas no vestibular acabou passando em Biologia. Seja pelo acaso ou pelo destino, ele percebeu que estava exatamente onde deveria estar. “Acho que a Biologia e a sala de aula me escolheram”.

Nesta missão, optou por lecionar no ensino público, por acreditar que poderia fazer a diferença na vida de quem tem menos oportunidades. E deu certo: ele conta com satisfação que teve alunos que passaram em medicina na Universidade de São Paulo (USP), que fizeram mestrado e muitos que se inspiraram nele para seguir a profissão de biólogo.

“A educação pode fazer muita diferença na vida das pessoas” @Léu Britto/ Agência Mural

Cria de Caieiras, na Grande São Paulo, Renan atualmente reside em Vila Gomes, zona oeste, e precisa percorrer mais de 50 km diários de sua quebrada até a Etec Paulistano. O trajeto compensa por estar junto com jovens da periferia, como ele foi um dia. Aliás, o docente que inspira caminhos, também foi inspirado por seus professores, em especial o de Biologia, da época do ensino médio, além de sua mãe, professora de português e inglês.

O meio o estimulou, mas a vontade de dar aulas veio depois que ele foi voluntário em um projeto social no mesmo colégio que estudou quando tinha 16 anos. Lá, o professor teve uma das suas experiências mais marcantes de sua vida: auxiliar na alfabetização de uma mulher idosa, impedida pelos pais e pelo marido de estudar.

“A primeira vez que ela conseguiu escrever o nome sozinha, ela chorou. Eu brinco que isso aí foi a sementinha plantada, porque eu vi que, por meio do ensino, a gente pode fazer muita diferença na vida das pessoas”.

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Esta reportagem foi produzida com apoio da Report For The World

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Jacqueline Maria da Silva

Jornalista formada pela Uninove. Capricorniana raiz. Poetisa. Ama natureza e as pessoas. Adora passear. Quer mudar o mundo e tornar o planeta um lugar melhor por meio da comunicação. Correspondente de Cidade Ademar desde 2021. Em agosto de 2023, passou a fazer parte da Report For The World, programa desenvolvido pela The GroundTruth Project.

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