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Nas periferias de SP, um ano de pandemia significa perder até dois vizinhos por dia

Por: Paulo Talarico

Covas abertas no cemitério de Perus, na região noroeste. Na Grande São Paulo são 33 mil vítimas @Ira Romão/Agência Mural

Leonardo Barbeiro, 25, viu vizinhos, familiares e amigos morrerem por causa da Covid-19. Ele vive em Sapopemba, na zona leste de São Paulo, periferia da cidade que registra o maior número de vítimas da pandemia na capital. 

Por ali, até 11 de março, 782 moradores não resistiram à doença ou morreram sem saber o resultado dos exames, dentro das mais de 27 mil vidas perdidas na capital apenas para esta doença – fora todas as outras causas como violência e outras enfermidades.

Citar os números em geral, muitas vezes, não tem mais sensibilizado depois de tanto tempo de pandemia. Mas no caso de Sapopemba e de outras periferias é dizer que todo dia, duas pessoas morreram por causa da doença. É imaginar sua rua durante um ano e, todo dia, ver dois moradores a menos nela. 

É assim que a capital e as 39 cidades da Grande São Paulo – assim como boa parte do Brasil – completaram um ano de pandemia nesta semana. Com hospitais perto da lotação, dificuldade para garantir atendimento a todos, alta de casos e uma fase ainda mais restritiva de isolamento para tentar conter o coronavírus. 

A chamada fase emergencial, anunciada pelo governo do estado que estipula toque de recolher a partir das 20h, proibição de celebrações religiosas e jogos de futebol, ocorre quando a região metropolitana chegou a 999 mortes durante uma semana.

A Agência Mural contabiliza nesta página os dados oficiais sobre a pandemia desde maio e o impacto nas periferias. Nela é possível ver que apenas oito meses atrás a pandemia estava nesse grau.    

A realidade de Sapopemba encontra similaridade com outros bairros que são atingidos pela desigualdade social. Quem mais se aproxima é a Brasilândia com 622 mortes (1,7 por dia). 

Por lá, uma das regiões com maior número de favelas em São Paulo, como a da Tribo, dificuldades para cumprir o isolamento [com casas pequenas] e a falta de saneamento básico eram problemas vistos desde o início da pandemia. Um hospital, que estava com obras atrasadas, foi inaugurado para tratar casos da doença, um dos muitos que estão com a capacidade praticamente esgotada. 

Apesar da lotação e do aumento de casos, alguns bairros tiveram a sensação de vida normal. Até por conta do transporte público lotado, para quem ia ao trabalho e o agravamento da falta de dinheiro.

Neste momento, os recursos destinados às famílias mais pobres ficaram mais escassos, pois o auxílio emergencial ainda está sendo discutido pelo governo federal. Com isso, muita gente precisa sair às ruas por conta da falta de comida. 

Pequenos comerciantes como donos de bares também falam da necessidade de seguir abertos para não perder os negócios, que já foram abalados ano passado. Já na fase vermelha, lideranças comunitárias apontaram a dificuldade para voltar a fechar estabelecimentos nesse momento.

Mas a alta de casos desde o fim do ano complicou a situação. Em outubro, cerca de 40% da capacidade das UTIs (Unidades de Terapia Intensiva) estava ocupada. Agora, a média é de quase 90%.

O governo do estado alega que há o triplo de UTIs desde o começo da pandemia e que a questão não é apenas abrir leitos, mas ter profissionais para cuidar de tantos pacientes. 

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Outras regiões seguiram o clima normal com realização de eventos, celebrações religiosas, e festas – que aconteciam nas periferias e no centro.

O auxiliar administrativo Felipe Moreira, 26, contava sobre esse sentimento de normalidade ainda em junho no Grajaú, região de 400 mil moradores na zona sul de São Paulo. 

“Todo mundo sabe do que está acontecendo. Mais parece aquele sentimento: aconteceu com aquela pessoa mas não vai acontecer comigo”. Na época, eram 183 moradores haviam morrido – hoje são 617.

Pela zona sul, a mesma região do Grajaú, vários distritos superam a marca de uma vítima por dia, como Cidade Ademar, Jardim São Luís, Sacomã e Capão Redondo. 

Enquanto os problemas se agravam, a principal esperança está na vacina. Iniciada em janeiro, ao menos 1,2 milhão de moradores tomaram ao menos a primeira dose na Grande São Paulo – 700 mil só na capital.

No entanto, isso corresponde a 12% dos habitantes. Ainda levará tempo e ainda não se sabe quando todos os adultos estarão imunizados por conta do número de doses disponíveis e que ainda serão produzidas. 

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